Clostridium difficile e o papel do microbioma intestinal
- Berenice Cunha Wilke
- 16 de jun. de 2020
- 3 min de leitura
Atualizado: 2 de dez.
O que é o Clostridium difficile
O Clostridium difficile é uma bactéria gram-positiva, anaeróbia estrita e formadora de esporos, naturalmente presente na flora intestinal de cerca de 3% dos adultos e 66% das crianças.Em condições normais, o microbioma intestinal saudável impede o crescimento excessivo dessa bactéria.Porém, quando há desequilíbrios da microbiota intestinal (disbiose) ou redução da imunidade, o C. difficile pode se tornar agressivo e causar doença.
Essa bactéria é uma das principais causas de diarreia infecciosa e colite pseudomembranosa, condições que apresentam alta morbidade e mortalidade.Nos Estados Unidos e Canadá, estima-se que ocorram mais de 300.000 casos por ano, resultando em cerca de 25.000 mortes anuais.
Toxinas e mecanismos de ação
O C. difficile produz principalmente duas toxinas, conhecidas como toxina A (TcdA) e toxina B (TcdB).Ambas destroem as células intestinais e desencadeiam uma resposta inflamatória intensa, levando a diarreia, dor abdominal e colite pseudomembranosa.Em cepas mais virulentas, há ainda uma terceira toxina, chamada toxina binária (CDT), que aumenta a capacidade de invasão e gravidade da infecção.
O papel do microbioma intestinal
O intestino grosso abriga cerca de 4.000 espécies bacterianas diferentes, que competem entre si por nutrientes e espaço, formando uma barreira natural contra patógenos.Quando o equilíbrio é rompido — especialmente após o uso de antibióticos — ocorre redução de filos importantes como Firmicutes e Bacteroidetes, favorecendo a proliferação do C. difficile.
Outros fatores que fragilizam o microbioma e aumentam o risco de infecção incluem:
Uso de antiácidos (inibidores de bomba de prótons);
Dietas pobres em fibras;
Hospitalizações prolongadas;
Idade avançada e doenças crônicas.
Apresentação clínica
A infecção por Clostridium difficile pode variar muito:
Portador assintomático — não apresenta sintomas, mas pode transmitir a bactéria;
Quadros leves — diarreia aquosa e desconforto abdominal;
Formas graves — colite pseudomembranosa e megacólon tóxico, com risco de desidratação grave e óbito.
Vias de contágio
Durante muito tempo acreditou-se que o C. difficile era transmitido apenas em ambientes hospitalares.Hoje se sabe, graças ao sequenciamento do microbioma, que apenas cerca de 35% dos casos têm origem hospitalar.
Outras vias de contágio incluem:
Alimentos contaminados, especialmente carnes e frutos do mar, já que os esporos do C. difficile podem resistir ao cozimento;
Produtos vegetais, quando irrigados ou adubados com material contaminado;
Água contaminada;
Transmissão fecal-oral — por mãos contaminadas ou superfícies mal higienizadas.
Uma vez ingerido, o microrganismo se instala no cólon e ceco, onde libera toxinas que lesam o epitélio intestinal.
Diagnóstico
O diagnóstico combina avaliação clínica e testes laboratoriais.São utilizados:
Detecção das toxinas A e B nas fezes por imunoensaio (ELISA);
PCR para identificação do gene da toxina;
Colonoscopia, quando há suspeita de colite pseudomembranosa, que mostra placas amareladas aderidas à mucosa.
Tratamento
O primeiro passo é suspender o antibiótico que causou o desequilíbrio intestinal.Em seguida, busca-se restaurar o microbioma com:
Probióticos (como Lactobacillus acidophilus, L. casei e L. rhamnosus);
Prebióticos (fibras solúveis como inulina e FOS);
Alimentação rica em vegetais e fibras fermentáveis.
Nos casos persistentes ou graves, podem ser usados antibióticos específicos, como vancomicina oral ou fidaxomicina.
Quando há múltiplas recorrências, o transplante de microbiota fecal tem mostrado taxas de sucesso superiores a 90%, tornando-se a terapia preferida em centros especializados.
Prevenção
Uso racional de antibióticos;
Higiene adequada das mãos;
Alimentação rica em fibras;
Evitar automedicação e uso prolongado de inibidores de ácido gástrico.
Conclusão
O Clostridium difficile é um exemplo claro de como o equilíbrio do microbioma intestinal é essencial para a saúde.A restauração da flora protetora, por meio de alimentação adequada e probióticos, é um dos pilares mais promissores não apenas no tratamento, mas também na prevenção de recorrências.

Sou Dra. Berenice Cunha Wilke, médica formada pela UNIFESP em 1981, com residência em Pediatria na UNICAMP. Obtive mestrado e doutorado em Nutrição Humana na Université de Nancy I, França, e sou especialista em Nutrologia pela Associação Médica Brasileira. Também tenho expertise em Medicina Tradicional Chinesa e uma Certificação Internacional em Endocannabinoid Medicine. Lecionei em universidades brasileiras e portuguesas, e atualmente atendo em meu consultório, oferecendo minha vasta experiência em medicina, nutrição e medicina tradicional chinesa aos pacientes.
Para saber mais:
Peng Z, Ling L, Stratton CW, Li C, Polage CR, Wu B, Tang YW.Emerg Microbes Infect. 2018 Feb 7;7(1):15
Burke KE, Lamont JT. Gut Liver. 2014 Jan;8(1):1-6.
Dissemination of Clostridium difficile in food and the environment: Significant sources of C. difficile community-acquired infection?
K Warriner et all.
J Appl Microbiol. 2017 Mar; 122 (3): 542-553.






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