top of page

OBESIDADE – A VERDADE POR TRÁS DO PESO

  • Foto do escritor: Berenice Cunha Wilke
    Berenice Cunha Wilke
  • 26 de ago.
  • 4 min de leitura

Um dia, a pessoa se olha no espelho e se pergunta: “Como foi que meu corpo mudou tanto?”


Nunca tinha visto aquele número na balança antes. Durante muitos anos, o peso parecia estável, mas, aos poucos, quase imperceptivelmente, ele foi aumentando. Hoje, está visivelmente maior do que gostaria.


O que aconteceu?Foram anos de estresse, de muito trabalho, pouco tempo para si mesma, menos caminhadas e treinos do que desejava. A alimentação, que poderia ser simples e equilibrada, acabou se tornando mais abundante e variada do que o corpo realmente precisava.


Esse processo não foi de um dia para o outro. Foi silencioso, gradual. E, de repente, a mudança ficou clara: o corpo já não era mais o mesmo.


A resposta comum: “coma menos e se exercite mais”

Essa costuma ser a recomendação mais repetida quando o assunto é obesidade. Mas será mesmo que esse é o caminho?Se fosse tão simples, já teríamos uma solução definitiva, e a obesidade não estaria atingindo o mundo em níveis epidêmicos.


Na prática, múltiplos fatores atuam juntos, e cada pessoa reage de forma diferente à alimentação, ao estresse, ao sono, à atividade física e às dificuldades emocionais.


Um marco da história da humanidade

Quando, em um futuro distante, olharmos para trás e listarmos os grandes marcos da humanidade após 1900, certamente estarão presentes as guerras, a descoberta da internet, a pandemia de Covid-19 e a epidemia de obesidade.


As mudanças no corpo humano foram impressionantes: se considerarmos da era paleolítica até hoje, uma espessa camada de gordura foi acrescentada.


Atualmente, as pessoas magras são minoria no Ocidente — um contraste marcante com toda a história da humanidade. Em 1990, o CDC (Centro de Controle de Doenças dos EUA) declarou oficialmente que uma epidemia de obesidade havia se instalado. Hoje, um em cada três adultos no planeta tem excesso de peso, e um em cada nove já é obeso. E, apesar dos bilhões de dólares investidos em dietas da moda, academias e medicamentos, os números não param de crescer. Isso ocorre mesmo diante do enorme esforço científico e farmacêutico para conter o problema.


Será que comemos mais do que antes?

A ideia de que engordamos porque “comemos demais” não encontra respaldo nas pesquisas. Em vários países, os estudos de consumo alimentar mostram justamente o contrário: comemos menos e engordamos mais.


No Reino Unido, por exemplo:

  • Em 1945, o consumo de gordura era de 92g/dia por pessoa.

  • Em 1960, quando a obesidade era rara, esse número era de 115g/dia.

  • Em 2000, quando a obesidade já era comum, havia caído para 75g/dia.


O mesmo aconteceu com o açúcar. O consumo de açúcar de mesa caiu de cerca de 500g semanais por pessoa no fim dos anos 1950 para 100g semanais em 2000. Mesmo com o aumento dos alimentos industrializados, as estimativas apontam que desde os anos 1980 os ingleses consomem cerca de 5% menos açúcar.


As calorias também diminuíram. Em 1945, a ingestão média era de 2665 kcal/dia por adulto. Em 2000, havia caído para 1750 kcal/dia.Nos EUA, o padrão é semelhante: o consumo calórico caiu, mas a obesidade aumentou — já atingindo um quarto da população.

Se gordura, açúcar e calorias não explicam a epidemia, o que mudou?


A queda do consumo de fibras

Os estudos mostram que o consumo de fibras despencou.


Em 1940, um adulto no Reino Unido consumia cerca de 70g de fibras por dia. Hoje, esse número gira em torno de 20g. Isso reflete a queda no consumo de frutas, verduras e legumes.


Uma dieta rica em vegetais alimenta uma microbiota intestinal mais diversa e equilibrada, frequentemente associada ao peso normal e à melhor saúde metabólica. Essa pode ser uma das peças-chave para entendermos a relação entre alimentação moderna e obesidade.


E o sedentarismo?

Outro argumento comum é que engordamos porque nos exercitamos menos. Mas será que isso é verdade?


Estudos com os Hadza, povo caçador-coletor da Tanzânia, mostram que o gasto energético deles — que caminham quilômetros por dia em terrenos difíceis — não é significativamente maior que o dos ocidentais, quando ajustado ao tamanho corporal. Essa semelhança em diferentes culturas desafia a ideia de que o sedentarismo seja o principal culpado.


Além disso, mesmo em períodos de explosão de atividade física, como nos EUA nos anos 1970, a população continuou ganhando peso. Pesquisas com corredores mostram que, embora aqueles que correm mais tendam a pesar menos, todos ganham peso ao longo dos anos — até mesmo os que correm 60 km por semana. Isso acontece porque, ao queimarmos mais calorias, tendemos a compensar aumentando a ingestão alimentar e reduzindo o gasto em outras atividades cotidianas. Isso não diminui a importância da atividade física. Ela é fundamental para a saúde cardiovascular, óssea, mental e metabólica. Mas, para perda e manutenção de peso, precisa estar sempre associada a uma alimentação adequada e equilibrada.


Uma visão mais ampla

Portanto, a obesidade não pode ser entendida como um simples problema de excesso de calorias ou falta de exercícios. Ela é resultado de uma interação complexa entre genética, microbioma intestinal, metabolismo, hábitos alimentares, estresse físico e mental, qualidade do sono, ambiente e atividade física.


ree

É por isso que precisamos de uma nova abordagem, individualizada e multidimensional, para compreender melhor — e enfrentar — essa epidemia que já se tornou um dos maiores desafios de saúde pública da história da humanidade.






Sou Dra. Berenice Cunha Wilke, médica formada pela UNIFESP em 1981, com residência em Pediatria na UNICAMP. Obtive mestrado e doutorado em Nutrição Humana na Université de Nancy I, França, e sou especialista em Nutrologia pela Associação Médica Brasileira. Também tenho expertise em Medicina Tradicional Chinesa e uma Certificação Internacional em Endocannabinoid Medicine. Lecionei em universidades brasileiras e portuguesas, e atualmente atendo em meu consultório, oferecendo minha vasta experiência em medicina, nutrição e medicina tradicional chinesa aos pacientes.

 

 Para saber mais:

Chin SH1, Kahathuduwa CN1,2, Binks M1.

Obes Rev. 2016 Dec;17(12):1226-1244

Por que engordamos e o que fazer para evitar?

Taubes, Gary.

L&PM Editores.


Pontzer H.

Am J Hum Biol. 2015 Sep-Oct;27(5):628-37.

Comentários


bottom of page