top of page

FUT2, Microbiota e B12: o que muda para você

  • Foto do escritor: Berenice Cunha Wilke
    Berenice Cunha Wilke
  • 14 de nov.
  • 4 min de leitura

As superfícies do nosso corpo que fazem contato com o meio externo — boca, trato digestivo, bexiga, vagina, útero e vias respiratórias — são revestidas por moléculas específicas que funcionam como “sinais de identificação”. Esses sinais determinam quais bactérias, vírus e fungos conseguem se fixar e colonizar cada região.


Entre esses marcadores, um dos mais importantes é o FUT2, um gene que determina se você é secretor ou não-secretor dos antígenos do sistema ABO nas secreções corporais.


O que o FUT2 faz?

O gene FUT2 codifica a enzima alfa(1,2)-fucosiltransferase, responsável por adicionar moléculas de fucose a glicoproteínas da mucosa. Isso permite:

  • a presença dos antígenos ABO na saliva, muco intestinal, secreções respiratórias, leite materno e fluidos vaginais;

    • a síntese de fucosil-oligossacarídeos, como a 2’-fucosilactose, um dos prebióticos naturais mais importantes para bifidobactérias.


Secretor x Não-secretor: o que muda?


1. Pessoas secretoras (FUT2 funcional)

  • Secretam antígenos ABO nas secreções.

  • Esses antígenos funcionam como pontos de fixação para bactérias benéficas.

  • Produzem naturalmente fucosil-oligossacarídeos, que nutrem o microbioma saudável.

  • Tendem a ter maior presença de Bifidobacterium, sobretudo B. longum e B. bifidum.

    • Consequentemente, têm maior proteção contra bactérias patogênicas.


2. Pessoas não-secretoras (FUT2 inativo ou com polimorfismos)

  • Não produzem antígenos ABO nas secreções.

  • A mucosa intestinal tem menos pontos de fixação para bactérias benéficas.

  • Produzem menor quantidade de fucosilactose, reduzindo o crescimento de bifidobactérias.

  • Microrganismos patogênicos colonizam com maior facilidade.

  • Apresentam maior risco de disbiose, principalmente com sintomas como:

    • inchaço,

    • refluxo,

    • intestino preso ou alternância,

    • dor abdominal.


Cerca de 20% da população mundial é não-secretora, dependendo da etnia.


Doenças associadas aos polimorfismos do FUT2

Estudos de 2010 a 2024 mostram associação entre o status NÃO-secretor e maior risco de:

  • Doença de Crohn

  • Doença celíaca

  • Diabetes tipo 1

  • Infecções urinárias de repetição

  • Candidíase recorrente

  • Úlceras gástricas e duodenais

  • Colonização persistente por H. pylori

  • Cáries e tártaro dentário

  • Otite média recorrente


A razão principal: menor presença de bifidobactérias e maior vulnerabilidade da mucosa.


FUT2 e vitamina B12

Meta-análises recentes confirmam que pessoas não-secretoras apresentam menores níveis séricos de vitamina B12, provavelmente por:

  • alterações no microbioma que prejudicam a absorção de cobalamina,

  • maior inflamação de mucosa,

  • menor presença de bactérias produtoras de cofatores úteis ao transporte da B12.


Não-secretores precisam atenção especial à B12, principalmente vegetarianos ou pessoas com gastrite autoimune.


FUT2 no aleitamento materno

Essa é uma das áreas mais importantes e bem estudadas.


Mães secretoras

  • Produzem 2’-fucosilactose (2’-FL) e outros HMO fucosilados.

  • Esses HMOs alimentam intensamente as bifidobactérias no intestino do bebê.

    • A instalação de uma microbiota saudável ocorre mais cedo e de forma mais robusta.


Mães não-secretoras

  • Produzem pouco ou nenhum HMO fucosilado.

  • O bebê pode ter:

    • instalação mais lenta de bifidobactérias,

    • maior risco de cólicas,

    • maior permeabilidade intestinal,

    • maior inflamação,

    • maior suscetibilidade a patógenos.


Hoje, já existem fórmulas e suplementos contendo 2’-fucosilactose para tentar compensar essa diferença.


Principais SNPs do FUT2

' Os polimorfismos mais estudados são:

  • rs601338 (G428A) → o mais importante; define a maioria dos não-secretores.

    • AA → NÃO-secretor (perda completa da FUT2, por causa do stop codon W143X)

  • rs602662

    • AA → NÃO-secretor 

  • rs492602

    • AA → NÃO-secretor 


O rs601338 (alelo A) é o mais fortemente associado ao fenótipo não-secretor.


É possível compensar o déficit do FUT2?

Sim — essa é uma das grandes mudanças dos últimos anos.

Intervenções que podem ajudar não-secretores:


Prebióticos que contêm fucose ou imitam HMO

  • 2’-fucosilactose (2’-FL)

  • Lactulose

  • GOS + FOS

  • Fibras solúveis específicas (acácia, psyllium, polidextrose)


Probióticos direcionados

  • Bifidobacterium longum

  • B. infantis

  • B. breve

  • Lactobacillus rhamnosus GG


Dieta rica em polifenóis

Aumenta a diversidade da microbiota e reduz patógenos oportunistas.


Evitar antibióticos desnecessários

Não-secretores sofrem mais com disbiose após antibióticos.


ree


Sou Dra. Berenice Cunha Wilke, médica formada pela UNIFESP em 1981, com residência em Pediatria na UNICAMP. Obtive mestrado e doutorado em Nutrição Humana na Université de Nancy I, França, e sou especialista em Nutrologia pela Associação Médica Brasileira. Também tenho expertise em Medicina Tradicional Chinesa e uma Certificação Internacional em Endocannabinoid Medicine. Lecionei em universidades brasileiras e portuguesas, e atualmente atendo em meu consultório, oferecendo minha vasta experiência em medicina, nutrição e medicina tradicional chinesa aos pacientes.



Para saber mais:


Uma História Natural do Polimorfismo FUT2 em Humanos

Anna Ferrer-Admetlla. Mol Biol Evol Sep. 2009; 26 (9): 1993-2003.


🧬 1. FUT2, secreção ABO e fenótipo secretor

  1. Kelly RJ et al. Sequence and expression of a candidate for the human Secretor blood group α(1,2)fucosyltransferase gene (FUT2). J Biol Chem. 1995.🔗 https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/7822328/

  2. Koda Y et al. Molecular basis for secretor type α(1,2)-fucosyltransferase gene deficiency in a Japanese population. Hum Genet. 2001.🔗 https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/11281457/


🧫 2. FUT2 e composição da microbiota intestinal

  1. Rausch P et al. Colonic mucosa-associated microbiota is influenced by FUT2 genotype. PNAS. 2011.🔗 https://www.pnas.org/doi/10.1073/pnas.1000132107

  2. Wacklin P et al. Secretor genotype (FUT2) is strongly associated with the composition of the human intestinal microbiota. PLoS One. 2011.🔗 https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/21949700/🔗 https://doi.org/10.1371/journal.pone.0020113

  3. Wacklin P et al. Faecal microbiota composition in adults is host genotype–dependent and shaped by FUT2 status. Gut. 2014.🔗 https://gut.bmj.com/content/63/1/144


🔥 3. FUT2 e doenças intestinais (Crohn, Celíaca, IBD)

  1. Franke A et al. Genome-wide meta-analysis increases to 71 the number of confirmed Crohn’s disease susceptibility loci. Nat Genet. 2010.🔗 https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/21102463/

  2. McGovern DPB et al. FUT2 non-secretor status is associated with Crohn’s disease. Nat Genet. 2010.🔗 https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/21102464/

  3. Smyth DJ et al. FUT2 nonsecretor status links type 1 diabetes susceptibility and resistance to infection. Diabetes. 2011.🔗 https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/21617176/


🦠 4. FUT2, infecções e imunidade

  1. Lindesmith L et al. Human susceptibility and resistance to Norwalk virus infection. Nat Med. 2003.🔗 https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/12669047/

  2. Thorven M et al. The FUT2 secretor status affects susceptibility to norovirus GII.4 variants. J Infect Dis. 2005.🔗 https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/15809903/


💉 5. FUT2 e Vitamina B12

  1. Hazra A et al. Common variants of FUT2 are associated with plasma vitamin B12 levels. Nat Genet. 2008.🔗 https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/18836446/

  2. Tanaka T et al. Genome-wide association study of vitamin B12 concentrations. Hum Mol Genet. 2009.🔗 https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/19304783/

  3. Lin X et al. FUT2 genotype is associated with serum vitamin B12 concentrations in adults. Br J Nutr. 2012.🔗 https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/21736750/


🍼 6. FUT2, HMOs e leite materno

  1. Bode L. Human milk oligosaccharides: every baby needs a sugar mama. Glycobiology. 2012.🔗 https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/21430253/

  2. Lewis ZT et al. Maternal secretor genotype affects the infant gut microbiota via HMO composition. Am J Clin Nutr. 2015.🔗 https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/25527757/


🥛 7. HMOs e 2’-Fucosilactose (2’-FL)

  1. Elison E et al. Safety and modulation of the gut microbiota with 2’-fucosyllactose in adults. Nutrients. 2016.🔗 https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/26840301/

  2. Kobata A. Structure and application of human milk oligosaccharides. Trends Glycosci Glycobiol. 2015.(PDF) 🔗 https://www.jstage.jst.go.jp/article/tgg/27/152/27_119/_pdf

Comentários


bottom of page